Passei por todos os estágios do término numa fração de segundos. Primeiro, exigi um desfecho que se fez por parte na minha imaginação, já que antes mesmo de incitá-lo, eu já havia discutido comigo mesma centenas de vezes, certa de quais seriam suas respostas. Nesse momento, eu chorei. Chorei mesmo, descontroladamente, por tudo que nunca havíamos dito. Vê se pode, coisa de doida, não é? “Sentada em um quarto escuro, falando sozinha, ela chorava.”, minha mãe provavelmente diria aos médicos quando viessem me buscar.
“É só paixão, Dr.” Mas ele já deve saber, a paixão deixa a gente meio louca mesmo.
Depois veio a desculpa. Eu precisava de qualquer pretexto para falar com ele. Precisava dar um jeito de transformar um bom dia em “POR QUE VOCÊ NÃO ME AMA MAIS?!”. Insano, patético. Era isso que eu queria. Essa era eu. Mas não antes sem ser um gênio da dramaturgia, busquei nos detalhes a distorção perfeita da frase. Nessas horas, tenho certeza que a Glória Perez babaria por mim. “Menina prodígio”, eles diriam. Mas que nada! Eu só alimento o amor com insensatez, uso da loucura para encontrar meu equilíbrio.
Consegui puxar a conversa pro lado que eu queria; falaríamos de nós. Me pergunto se o pobre coitado da outra linha sabia que foi tudo de caso pensado, mas não deixo que esse pensamento permaneça. Agora é hora de sentir pena de mim e de acreditar que eu mereço, de fato, esse desfecho. E não, que estava procurando sarna pra me coçar. Porque assim, é bem verdade que eu poderia ter deixado isso quieto, afinal, não nos falávamos há alguns dias, mais alguns e ficaria tudo bem, não é? Mas não, não eu. Pra mim, nunca acaba quando termina. Tem que ter mais, tem que ter um diálogo interminável, tem que expor os piores segredos. Falando nisso, posso fazer uma confissão? Desfecho tem mais é que doer, dilacerar meu coração. O término, não. Tem que ser bonzinho, tem que ser devagar, tem que terminar com promessas de que tudo vai ficar bem e sempre estarão ao lado um do outro para o que precisar. O término precisa ter esse aconchego, até porque pra um dos dois está sendo um alívio quanto para o outro, um martírio.
Mas o desfecho é quando os dois já estão em processo de superação. É só pra você fortalecer pra si mesma os motivos pelos quais é bom não estar com ele, intercalando com frases do tipo “apesar disso, eu queria estar com você”. Que, sejamos francas, são como deixar uma porta aberta. São como dizer: Ei, dessa vez não valeu, mas quem sabe na próxima, ok? Sentido não deve fazer nenhum. Aliás, se perigar fazer sentido, pare tudo e comece novamente. E, dessa vez, só pare de novo quando estiver falando sobre as nuvens do céu e dos protozoários do lençol. Vai falando, vai falando. Despeje tudo como se não houvesse filtro mental.
Quando a primeira resposta dele coincidiu com minha trama experimentei uma espécie de alegria maligna. Do tipo: haha, te peguei! Sequer controlei meu risinho de canto de boca de quando a previsão do horóscopo acerta. Eu estava me sentindo a própria Mãe Dinah. Mas na hora só pude pensar na minha resposta calculada e como ficaria linda naquele momento. Sério. Inclusive, tive muita sorte por tê-la escrito, aliás, por ser uma discussão por escrito. Como é incrível ter nossa obra prima de término em mãos depois – e até a eternidade. Obrigada, internet! Se fosse olho no olho, eu teria gaguejado em cinco minutos e chorado logo depois.
A partir daí, foi bem fácil. Algumas juras que eu nunca iria cumprir para fazê-lo sentir-se mal, alguns pedidos de desculpas disfarçados em um cuidado pelo bem estar do outro que simplesmente não existe e, por fim, as conclusões que calejavam o peito. A verdade nua e crua, mas amaciadíssima pelo ego do indivíduo.
Então, esperei que ele me cuspisse seus verdadeiros motivos, seus porquês sobre não darmos certo. Esperei que ele dissesse tudinho, e como um turbilhão revidei cada alternativa fazendo-o pensar que eu poderia ser tudo que ele queria. Podia mesmo. Mas eu não queria porque ele não merecia. Ou, na verdade, eu também não merecesse. Honestamente, nunca fui flor que se cheire.
Claro que o tiro saiu pela culatra e acabei “ouvindo” coisas que não havia previsto. Talvez, ele entendesse desse jogo tanto quanto eu. Não sei. Só sei que me senti realmente mal. Aí veio o choro e a vontade do olho no olho. Porque quando a gente chora, olha no olho é sempre bom. Comove. Envolve. Do jeito que eu estava, ele não poderia contra mim. No entanto, só tive afago do escuro, mais uma vez. Sentada em um quarto escuro, falando sozinha com o celular na mão, ela chorava. “Ficou pior, Dr.”, minha mãe diria. “Onde já se viu um aparelho daquele tamanho fazer uma menina chorar desse jeito?”.
Mal sabe ela que nele cabiam todos meus sonhos, todos meus medos e, naquele momento, toda minha esperança também. Porque, no final das contas, é só sobre isso que se trata: esperança. Maldita esperança.
Após secar minha última lágrima, me senti extremamente cansada daquilo tudo. Parecia que eu estava há dias carregando um peso enorme nas costas e agora me via livre, mas não o tipo de liberdade que me fizesse feliz, mas uma liberdade fadigada de quem diz “Ok, vida, você me venceu. Me deixei ir agora.”
Exagero, obviamente. Aliás, tudo, desde o princípio: um tremendo de um exagero.
Eu podia ter ficado quieta, não podia? Ou ter me contentado com meus ensaios sobre o fim, mas não, eu tinha que vive-lo. Inclusive, pensando bem, agora entendo que esse foi meu problema desde o início: a ânsia de viver o inventado. Fiquei cega pela projeção que criei de um romance, por alguém que cultivei em meu peito que sequer me deu o aval pra isso.
Se tem uma coisa que eu não posso dizer é que fui enganada. Não, eu não ouso abrir a boca para me colocar no papel de vítima; esse direito eu não tenho. Na verdade, a não ser em casos extremos, quem de fato é enganado ao se envolver com alguém? Ele não era o tipo que eu queria, disso eu já sabia. No fim das contas, tudo se tratou de uma escolha e pouquíssimas renuncias. Meu problema sempre foi esse: paixão por qualquer um, mas amor? Amor mesmo, sabe? Por ninguém. Exagero, obviamente, mas a gente sabe e mesmo assim faz.
Saber usar as palavras e traduzir sentimentos/pensamentos de gente que você nem conhece: você faz isso muito bem!
“Parecia que eu estava há dias carregando um peso enorme nas costas e agora me via livre, mas não o tipo de liberdade que me fizesse feliz, mas uma liberdade fadigada de quem diz “Ok, vida, você me venceu. Me deixe ir agora.” That’s it.