Você que acha que já viveu de tudo – e depois desse aumento de 10% do bolsa família em tempos de alta inflacionária, eu não duvido – que seus relacionamentos te ensinaram o que precisa saber pra ser blindado (em níveis que maratona de Maria do Bairro não puderam suprir) e que por isso você está completamente ciente de quais devem ser suas atitudes, bem como, as consequências das mesmas, você ainda é um remendado ou terminado. Quer queira, quer não.
Que cada caso é um caso, eu já sei. Aliás, já sei que você insiste em determinar a diferença do teu relacionamento com de outros pra justificar sua lógica. E suas atitudes iguais, diga-se de passagem. Mas a questão é que se você tiver escolhido o caminho da razão ou da razão-emocional (porque, na verdade, você sabe muito bem quando está “agindo por emoção”, mas se deixa levar, não porque não consiga ver as consequências na hora, mas porque não lhe importam realmente), no final das contas, as tuas opções foram seguir em frente ou dar outra chance, não é? Ou seja, ser um remendador ou um terminador se aplica a todo – me corrija se eu estiver errada – tipo de relação amorosa-derradeira-caótica. Em outras palavras: normal.
Se acha essa agulha no palheiro com pensamentos formados e opiniões distintas à maioria colecionadora de lembranças e conspirações de celibato? Bom, siga em frente e descubra seu perfil! (Voz de locutor do Domingo Legal).
Remendadores
Determinados ao ponto de serem cegos. São aquelas pessoas que se puserem na cabeça que alguém será capaz de fazê-las feliz, tendo motivos ou não para crer nisso, não vão desistir de tê-las até que esgotem absolutamente todas as alternativas – que incluem uma possível ordem de restrição.
Sentimentais o bastante para serem egoístas. Porque o real problema do sentimentalismo à flor da pele é que só enxergam a sua dor e seu amor. São intensos para se apaixonar sem medidas e sofrerem sem causa. E isso os torna incapazes de se pôr no lugar do outro, principalmente quando este estiver feliz sem ele. Quer dizer, amor mesmo devia se tratar de querer o bem de alguém acima do seu de forma complacente. E não de querê-lo pra si acima de seu bem. E até mesmo de sua própria felicidade.
Teimosos que se tornam chatos insistentes. Teimosia demais não é perspicácia, é veneno. Às vezes, você tem que aceitar que certos destinos já foram escritos e sem sua participação. Que centros confrontos já foram vencidos sem que você tenha visto. Às vezes, você tem que aprender a se desprender, mais do que à lutar. Ninguém quer estar ao lado de alguém que de tão insistente, satura, cansa. E, naturalmente, afasta.
“Não deixe que ninguém te faça sentir que você não merece o que você quer.”
Se eu fizesse psicologia ou, sei lá, hipnose, eu diria que foram pessoas educadas à moda antiga. E com isso, só pra deixar claro, quero dizer que foi a base dos clássicos da Sessão da Tarde. Quem nunca assistiu “Um príncipe em minha vida”, “10 coisas que eu odeio em você” e “Meu primeiro amor” não sabe o impacto que construções amorosas surreais podem trazer a sua vida.
Quer dizer, primeiro a história de um príncipe (remendador) que se apaixona por uma estudante pragmática demais pra crer em contos de fadas e o que é que ele faz? Não desiste dela. Depois o conto baseado na obra A Megera Domada – Catarina e Petrucchio, também inspiração de O Cravo e a Rosa – em que ele (remendador) não desiste dela, por mais insuportável que a garota seja e decide conquistá-la. E por último, a história de Vada (remendadora) que perde seu primeiro amor e melhor amigo e passa o resto da vida se lamentando – tanto é que fazem a sequência do filme – porque não aprendeu a seguir em frente. Mas, Samantha, por que citar referências culturais pra exemplificar o cotidiano? Não sei! Tenho essa inexplicável mania de justificar a realidade com a ficção. Por isso que eu sempre acho que se for pra ganhar na loteria, eu vou ganhar, afinal, Charlie encontrou o bilhete dourado pra visitar a Fantástica Fábrica de Chocolate comprando apenas UMA barra. Faz todo sentido.
Terminadores
Metódicos, define. Impecavelmente racionais, buscam incansavelmente seguir a lógica. Até mesmo seus impulsos são bem treinados. Não dão ponto sem nó, se divertem com a fragilidade alheia. Eu diria que inenarrável mesmo é o receio que tem de verdadeiramente se envolver. Procuram se ater a detalhes pra se prevenirem de eventos futuros que, talvez, nunca ocorram. Se sobrecarregam de dúvidas acerca do suposto destino da relação pra que, ao encontrar alguma “falha”, tenha a desculpa perfeita de se livrar.
Os terminadores tem a filosofia de se desapegar de tudo que lhes faz mal e com certo tempo de prática, acabam por se desapegar também de quem pode lhes fazer bem. Pra eles, se algo não for inteiramente bom, completamente positivo e absurdamente estável, não valem o risco. Aliás, risco este que não correm nem mesmo por um decreto! Se alimentam da certeza, da ínfima mania do saber. Precisam se sentir seguros o bastante pra ir em frente, por isso, eventualmente, testam.
Competem consigo mesmos ainda que não haja o que se ganhar no jogo. Eles só precisam não se sentir lesados, passados a perna. Claro que, quem nunca se machuca e tampouco se arrisca não tem tanta experiência pra dividir. Afinal, aquele que teve um relacionamento sem complicações, ainda assim, sequer pode dizer que foi perfeito. Até porque, perfeito mesmo é a capacidade de superação, de perdoar e de seguir em frente que cada um tem e, não, o grande orgulho em forma de barreira que limita o próximo passo.
“Foda-se. Como você sabe eu não quero ser sua amiga. Eu terminei com você.”
Eu diria que são assim proveniente a algum trauma. Não acredito que seja possível alguém simplesmente nascer descrente, desacreditado. Inclusive porque, até mesmo as piores histórias de amor que ouvimos na infância, tinham alguém para acreditar que dariam certo. Então, você se torna um terminador quando resolve generalizar qualquer tipo de envolvimento que tenha tido. Tem convicção de que amor não existe, ninguém presta e todo mundo um dia vai ser corno. Nesse caso, é muito melhor evitar o sofrimento que, obviamente virá com o tempo e com a quebra de suas expectativas, do que enfrentá-lo para também se tornar uma pessoa melhor, não é? O caminho da covardia é sempre o mais fácil.
Não defendo nem um, nem outro. Na verdade, em ambas escolhas tem pontos positivos e negativos. O possível equilíbrio entre elas que devia ser o ideal. Devia ser porque, sinceramente, não acho que um hipócrita humano seja capaz de alcançar esse patamar. Quantas vezes já não pagamos pela língua? E repetimos os mesmos erros? A diferença está entre ser alguém que busca isso ou alguém que se conforma. Porque, vamos combinar? Pior do que ser um remendador de corações ou terminador de histórias é ser um conformado, um indiferente, um que sequer é lembrado. Quem mesmo desgasta e machuca, acrescenta experiência. Quem ilumina e contagia, acrescenta esperança.
E se o desespero tomar de conta…