A verdade é que eu andei te procurando. Mas confesso que também procurava a mim dentro de ti. Torci o braço para não desistir, torci o nariz pra quem duvidasse, mas sobretudo, torci pra que quando seu olhar cruzasse com o meu, eu soubesse. Aliás, em cruzadas eu sempre me sai muito bem: das palavras aos caminhos, não perdia uma oportunidade. Se a gente escreve nosso próprio destino, o meu era um completo rascunho da corda bamba que eu me via sem você.
Depois daquela noite nada mais foi igual. Eu culpo sua covinha no queixo. Sério. Não dá para confiar em alguém com o rosto de vilão de desenho animado. Uma óbvia história fadada ao fracasso antes mesmo de começar. Éramos tão errados um para o outro que nosso único acerto foi não deixar que isso nos impedisse de tentar. No início, as diferenças nos uniram. Tínhamos consciência do estrago no final, mas quem é que pensa no fim? A gente quer que dure, a gente quer ser exceção. No fundo, todo mundo quer se sentir especial, saber que sua história motiva outras. Por isso, mesmo negando, a gente valoriza as diferenças, o oposto. Ninguém quer se apaixonar pelo próprio reflexo. Já conhecemos nossos defeitos, às vezes, o que nos motiva é também o que nos desafia.
Não posso dizer que não fui alertada. Eu sabia onde estava me metendo tão bem que construí saídas de emergência a base dos seus erros. Estava tão ciente deles que os listava diariamente. Talvez esse tenha sido o primeiro sinal: me acostumei com o pior de ti. Sua displicência já não me incomodava, eu não esperava nada. Talvez esse tenha sido o segundo sinal: se a gente não se decepciona, se surpreende. Mesmo assim, eu dizia que não estava apaixonada, o que eu sentia não chegava perto do que eu imaginava que a paixão fosse. Paixão não deveria me fazer perder os sentidos? Não deveria ser aquilo que me cega para as falhas? Mas se eu era racional quanto a isso, via um claro sinal de desapego.
Distante demais da realidade forjada de uma felicidade dividida; eu tinha a minha por inteiro, e absolutamente não sabia o que fazer com ela. Guardei-a como um segredo. Talvez por isso quisesse uma paixão a qualquer preço. Eu queria me dividir, me despedaçar. Em vãs tentativas de não soar apaixonada, parecia desequilibrada. Quanto mais eu insistia em me justificar, o sossego se esvaia como um balão perdendo ar. Eu estava perdendo a cabeça por você. O amor era tudo que eu pensava que não era.
E cada vez que eu dizia que não, meu coração batia numa confirmação ritmada. Uma voz ao pé do meu ouvido sussurrava “é isso” ao menor sinal da tua presença. Um vazio me rompia o peito e escorria pelos meus olhos com tua ausência. Meu deus, como eu amava a forma com que você me fazia sentir! Era o tipo de liberdade que eu nunca havia experimentado, eu podia ir aonde quisesse, mas tinha prazer em ficar ao seu lado. E pouco a pouco, tanta insistência deu lugar a esperança. Eu podia jurar que fomos feitos para dar certo, aliás, que tudo que havíamos passado antes de nos conhecermos foi um mero erro de diagnóstico.
Depois daquela noite nada mais foi igual. “Ele não leva ninguém a sério”, uma amiga me disse aos cochichos quando me viu com o olhar congelado em sua direção. “Foi dada a largada”, pensei comigo mesma. Não tinha frase que me incentivasse mais do que a insinuação de que eu não conseguiria mudá-lo. Pra falar a verdade, mulher tem dessas mesmo pra se sentir valorizada. Eu queria meu ferrete gravado na pele de todo clichê que enaltecesse meu ego. Porque se tem outra coisa que mulher adora é um clichê, um bordão. Aquela foi a primeira – talvez única – vez que me senti intimidada. Quebrei a cara, quebrei as regras. Paixão é tão impulsiva quanto avassaladora, mas amor é sempre exceção, agora sei disso.
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