Esses dias, eu estava trabalhando em um evento (ou seja, divã pra doido, mais uma vez). E comentei com meu colega justamente esse frequente acontecimento em que as pessoas me viam parada, sozinha, e pensavam “OLHA, TERAPIA GRATUITA!” e vinham desabafar. Citei o caso da noiva rebelde que detalhei em alguns posts atrás. Pra minha surpresa, o senhorzinho da limpeza se ateve a conversa e logo quis participar. Eu não lembro o nome dele, mas o achei muito parecido com o Dunga dos sete anões da Branca de Neve – começando pelo tamanho – então, vou chama-lo assim pra melhor descrição dos fatos.

“Todo mundo engana, minha filha.” – e assim ele começou me dizendo. Sem mais, nem menos. Sem introdução, sem uma apresentação sequer.

“Engana? Como assim?”

“Engana, ué. Homem, mulher, todo mundo engana.”

“Em um relacionamento que o senhor quer dizer?”

“Em tudo, mas principalmente em relacionamentos.” – Dunga coça a cabeça um tanto quanto desmotivado. Acho que esse assunto (que ele mesmo puxou, diga-se de passagem) de certa forma lhe toca em alguma ferida.

“Mas por que o senhor acha isso?” – Eu sei, sou insistente.

“Porque em um relacionamento de muito tempo as pessoas precisam se enganar. Senão, não vai pra frente.” – Imaginei-o com sua anãzinha em uma casinha que caberia no meu quarto, tão bonitinhos. Tudo em miniatura como amostras grátis de supermercado.

Droga, fugi do assunto.

“O senhor é casado?”

“Há 40 anos.”

“E já traiu?”

“No início, sim. Mas depois nunca mais. Ela sempre descobria, ela sempre dava um jeito. Ela sabia até antes de acontecer.”

“E sabe se ela te traiu?” – Eu toco na ferida, desculpe.

“Acho que não. Não sei, mas acho que ela nunca faria isso.”

“Ué, e de onde vem sua teoria que todo mundo engana?”

“Porque eu não conto pra ela tudo que acontece. Eu não conto da outra que me liga sempre. Não conto que ela vem aqui no trabalho. Eu a engano porque escondo dela pra não ter problema.”

 

Pausa dramática na história pra eu fazer um comentário: ATÉ O DUNGA TINHA MAIS DE UMA MULHER ATRÁS DELE E EU CONTINUO SOLTEIRA!!

 

“Mas isso não é enganar, eu acho… Enganar seria trair, principalmente, a si mesmo. Se você quer estar com outra, por que está com ela, afinal?”

“Porque eu me acostumei. Sou eu e ela desde sempre. Cuidamos dos nossos filhos, agora dos nossos netos. Nossa família é linda. A gente se acostuma a viver assim.”

Depois desse momento não lembro ao certo o que aconteceu. As possíveis opções são 1) eu fui comprar uma coxinha, 2) eu fiquei tão submersa nos meus pensamentos que não o vi saindo de perto, 3) eu fiquei distraída demais com a coxinha pra vê-lo se afastar. Ou os três.

Naquele dia, o velho Dunga me deixou com uma pulga atrás da orelha. Será mesmo que todo relacionamento duradouro é com base no conformismo? Você tem que se cegar pras coisas que poderiam afasta-los em prol de algo que julga mais estável? Mas a troco de que vem essa estabilidade? Da sua própria felicidade? Quando deixamos de ser felizes pra sermos acostumados?

Fiquei me perguntando o que faria um relacionamento durar. Amor, confiança, compromisso, honestidade e dinheiro, claro. Ninguém pensa no tempo, ninguém inclui o tempo como um fator imprescindível na paz matrimonial. As pessoas pensam que o tempo é consequência, que se houver todos esses outros ingredientes, então o tempo virá junto. De certa forma, eu vejo sentido nesse pensamento, mas não acho que seja bem assim. Acho que o tempo é um componente importantíssimo, pois ele dita as mudanças que teremos, o fortalecimento do sentimento, assim como o enfraquecimento daquela paixão juvenil. Basicamente, o tempo que mestra todo o relacionamento. E se não estivermos cientes dele, do cair na rotina, do chegar das rugas, e as próprias mudanças de comportamento que são naturais, então, casamento é utopia.

De fato, não tenho qualquer conhecimento da vida a dois. Ou de morar junto. Mas algumas opiniões são provenientes de princípios, valores. Eu discordo do Dunga quando ele diz que todo mundo engana. Discordo mais ainda quando se contenta com o pouco por achar que é o máximo que pode ter. Eu sei, eu sou nova. Talvez seja esse meu problema. Eu ainda tenho a esperança que ele já perdeu há muito tempo. Honestamente, eu o entendo. E eu sei que no fundo ele também inveja meus sonhos.

Pode ser que daqui há alguns anos seja eu contando essa história. Confirmando o que o Dunga me disse. Pode ser que de tanto me partirem o coração não me reste mais nenhum fio de esperança. Pode ser que eu me torne essa mulher conformada, acostumada e receosa de perder a estabilidade que lutei tanto pra conseguir. Pode ser que eu repasse essa história adiante, que muito tem a ver com o fato de engolir sapos pra sustentar uma relação. Eu não sei o que vai me acontecer, nem mesmo se irei casar, de fato. Mas eu sinto que não importa o que houver, eu não vou acabar com os sonhos de ninguém. Eu não vou deixar que alguém se perca na premissa de que “se não pode melhorar, pra que tentar?”. Eu vou persistir, vou insistir. Se não por essa busca de amor verdadeiro, pelo o que mais essa vida valeria a pena? O coração não se engana.

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