A mulher direita não fala palavrão, não come de boca aberta, nem senta de qualquer jeito. Mulher direita não fala alto, não é desaforada, nem barraqueira. Ela sabe se portar, é simpática com a família e educada com os amigos. Tem dessas de sorrir pra estranhos com uma complacente nobreza e resgatar animais da rua. Mulher direita não deve falar mal das amigas pelas costas ou desdenhar o desempenho, mesmo quando deixa a desejar, do parceiro. Na verdade, mulher direita não deve falar do que rola entre quatro paredes, nem deixar escapar seus despretensiosos fetiches.

Mulher direita tem que disfarçar o calafrio da lembrança daquele beijo quente na nuca, e a fissura do rosto contra o chão gelado. Deve evitar insinuações de que sente-se quebrada, destruída da noite pro dia. Deve conter a excitação da cueca boxer branca que insiste em se mostrar quase pedindo pra ser arrancada às pressas. Deve dizer que tem cabelos longos por elegância, estilo, e não porque são muito melhores de serem puxados. Mulher direita tem que se fazer de durona, ainda que por debaixo da roupa justa se escarne de molhada.  Tem que ser resistente à dor, à mágoa, e sensível ao toque, à pele. Tem que esconder a insegurança da relação quando domina por cima o vai-e-vem dos seus quadris. Tem que encobrir o olhar dos curiosos quando sem calcinha comprime seu corpo ao dele em falsa displicência.

Mulher direita tem que evitar discussões que a levem a admitir que prefere de quatro ou que geme alto. Deve protestar quaisquer dúvidas de que gosta de apanhar. Mulher direita não gosta, ama. E pede. Mas tem que omitir que também está no jogo pra gozar. Deve esconder a frustração de uma transa mal feita, um sexo sem pegada. Deve fingir que gosta de fazer amor, com carinho, com beijinhos. E contestar quem a acuse de escândalo. Mulher direita deve esquecer-se de seu sobrenome de puta que aos berros lhe excita. E que xingamentos podem ser, sim, deliciosos.

A verdade é que, em segredo, a mulher direita tem uma certa inveja dos homens que não precisam disfarçar seus grandes feitos casuais e nem silenciar suas performances monumentais. E, por vezes, tem vontade de se entregar a condenação da vida sem limiares, feita de preliminares. Um abraço, uma transa e um adeus. Mas, bem ou mal, a mulher direita valoriza a propagação dos erroneamente ditos bons costumes, boas maneiras. A falsa moral. Se desdobra, se converge e se refaz a fim de permanecer socialmente imaculada. E deixa a cargo de seus desejos sórdidos a ânsia de ser a puta de um homem só.

P.s: Para mal entendedores, esse texto é uma sátira da visão que a nossa sociedade, nossa cultura, implanta sobre as mulheres e os paradigmas que devem seguir. 🙂

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