metades

Por muito tempo, eu me sentia incompleta. Tinha a sensação de que faltava algo. A rotina diária já não tinha mais tanta graça, faltava emoção, adrenalina e experiências. E aí, quando estava me relacionando com alguém, a vida parecia agitar-se naturalmente. Encontros, expectativas, desejos. Havia uma fuga da realidade que eu depositava exclusivamente no outro. Ou melhor, no que o outro poderia me oferecer.

Na tentativa de suprir algo que faltava, escolhia alguém que só podia me dar metades. Que nunca estava por inteiro na relação. Por mais que eu me doasse inteiramente, o outro só podia me dar aquilo lhe era possível. É compreensível, já que, algumas pessoas tem certas limitações e sabem até onde podem se doar. A responsabilidade é individual e intransferível. No entanto, questiono aqui a minha responsabilidade. Era eu quem escolhia os mesmos tipos, mesmo que inconscientemente, achava melhor ter metades do que estar só.

Por medo da solidão, aceitava o que qualquer um podia me dar. E aí, quando não mais suportava migalhas, saía da relação ainda mais carente. Todos os caras que me envolvi, ao invés de deixarem um pouquinho do que podiam dar e de preencherem o que faltava em mim, pareciam me deixar ainda mais na falta. Quanto mais metades me davam, mais metade eu me tornava. Era um ciclo. Vicioso e desgastante.

De repente, depois de anos de análise, descobri que não há metades andando por aí. Eu não poderia ser metade, assim como não poderia aceitar isso dos outros. As pessoas são e estão completas. Elas só precisam se dar conta disso. Não há sentido em procurar a metade da laranja, a cara-metade, a tampa da panela e o queijo para a sua goiabada. Na grande maioria das vezes, tem-se todas essas opções em uma só pessoa. Basta que um esteja completo e satisfeito para que não haja necessidade de caçar metades.

Algumas vezes, é inevitável que o desejo de ter alguém para compartilhar se sobressaia sobre o não envolver-se com determinados tipos, em que o fim e o sofrimento já são previsíveis. É um aprendizado diário. Aprender a estar sozinha e a aceitar que não me falta pedaço algum. Na solidão, é possível descobrir ainda mais de você mesma. É um momento de preparação e autoestima para que, quando alguém vier acrescentar e nunca suprir, você saiba melhor como lidar.

Dessa forma, “metades da laranja” não virão mais ao meu encontro. Não é preciso metades para tornar-me completa. Estou pronta, inteira e intacta. Daqui para frente, só venha o que for para somar e não para dividir.

Afinal, contas de soma são muito mais fáceis do que as de divisão. Fica a dica.

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