Leia enquanto ouve:

(Essa música me lembra essa sensação de paz. Me dá uma vontade danada de rodopiar na beira do mar, de alma leve, cabelos soltos.)

Larguei os estudos pra me tornar artista plástica. Obviamente não tive apoio. Mas queria pintar a vida lá fora e fui. Aos 19 anos, fui morar na praia com uma mochila nas costas, e todos os sonhos do mundo. Nem celular com internet eu tinha. E não conhecia ninguém. Fiz amigos, inimigos, calos e feridas. Voltei dura como uma rocha. Fria, seca. Personificação do sangue no olho. Voltei ateu, consegui dois empregos, terminei os estudos. Aquela viagem mudou minha vida que nunca havia sido fácil, que me testava, me exaltava. Sinceramente, a vida sempre sacaneou comigo. Mas eu sabia exatamente onde estava minha paz: no fim de tarde na praia, deitada em uma espreguiçadeira lendo um livro. Eu não precisava de nada, nem mesmo de dinheiro e saber disso me libertou. Eu não pensava em mais nada além de que eu queria aquilo para o resto da minha vida. Até hoje não sei explicar o que eu sentia e, confesso, não foram muitas vezes desde então que pude me sentir daquele jeito. Mas eu já havia encontrado minha paz, cedo ou tarde, ela voltaria pra mim.

Meu maior aprendizado, no entanto, foi a guardar minha essência. Isso é o que eu sou. Sou brisa, sou leve, sou praia. Mas, não adianta, assim eu não sobreviveria nem mais um ano no mundo real. A nossa volta é tudo superficial, capitalista, mercenário. A gente faz o que precisa fazer pra conseguir o que quer e torce pra que isso seja suficiente; aprendi isso. Mas nunca é, e algumas pessoas passam a vida nessa incansável e infindável busca de estar satisfeito com o que pode mensurar valor. Aprendi isso também.

Passei anos em uma batalha interna buscando o que fizesse meu coração disparar, minhas mãos suarem. Buscando qualquer traço daquela paz que eu sentia mesmo adentro a loucura da vida urbana. Qualquer oportunidade, eu agarrava. Tudo me deixava na expectativa de que, talvez, fosse o primeiro passo para o meu futuro. Aquele futuro, sabe? Que a gente espera que nunca chegue, mas continua lutando por ele. Ou pra que ele, pelo menos, exista.

Deixei a arte de lado, entrei na engenharia. Comecei a dar meu sangue pra pagar meus estudos. Saí de um emprego pra ter mais tempo pra estudar. Eu tinha um plano, e parecia um bom plano, afinal de contas. Eu conseguia me ver anos luz à frente como alguém bem sucedida. Como alguém que eu devia ser. Como todos eram, talvez. Aliás, como todos buscavam ser.

Mas onde estava minha paz agora?

Não sei vocês, mas meus cadarços sempre estiveram desamarrados, na minha janela não tem rede de proteção, minhas paredes são pintadas, meus cadernos são rabiscados. Meu maior perigo sou eu mesma e tudo que eu busco; uma grade não me para. Até mesmo à beira do abismo, me recomponho. Essa batalha é minha, afinal. Acordo todos os dias prestes a me perder pro mundo, durmo todas as noites feliz por ter me vencido.

Não deu outra. O certo, o óbvio, o caminho seguro não era pra mim. Nunca foi. Larguei a engenharia, fui morar no Rio. Decidi ser escritora; agora pra valer. Não posso fugir da arte, aonde quer que eu vá, não posso fugir de mim.

É difícil pra caralho. Só eu sei. Tenho esse medo de nunca conseguir, de não ser boa o suficiente, de ser só mais um livro encostado na estante. Ou pior, nem chegar a ser esse livro. Meu futuro não se projeta mais na minha frente. Não tem quem me diga os passos que eu devo seguir. Todo dia é um risco, um novo obstáculo. E, às vezes, sinceramente eu penso em desistir de tudo. E me bate um desespero tremendo. Absolutamente não sei quem eu seria se eu não pudesse escrever sobre a loucura que me cerca.

Às vezes, me ausento do blog. Me ausento de mim mesma. Não penso em nada, não traço planos, não cumpro metas. Aliás, tenho sérios problemas com prazos: nunca os acho. Me interno em livros, filmes, em pessoas, mas principalmente, na solidão. São as conversas comigo mesma que me salvam. Coisa de gente doida, eu sei.

Já deixei passar muita gente boa por mim, não tive tempo pra me importar com elas. Não é justo fazer alguém se apegar pra que isso te satisfaça por um tempo. Já dizia o Pequeno Príncipe, se você cativa alguém tem que voltar por ela. Pra ela, talvez. Mas é difícil arranjar espaço pra mais alguém nessa vida que não cabe sequer dentro de mim.

E, daí, quando eu menos espero, recebo e-mails, recados, inbox que me fazem chorar.

michelle
Escolhi essa mensagem, em especial, porque ela também veio no momento certo.

Esse é o sentido de tudo. Esse é o meu sentido. Eu tenho minha paz de volta e tanto, tanto a agradecer. Não consigo encontrar palavras pra descrever como não há no mundo algo que me faça mais feliz do que isso.

Eu faria tudo de novo.

O que eu sinto hoje é insuperável. Muito melhor do que um fim de tarde na praia, muito melhor do que a certeza financeira, muito melhor do qualquer outro sentimento. Quando me sinto cansada – de tudo, do mundo, de continuar – eu procuro as mensagens que recebo e, enfim, meu coração dispara. Quando vocês compartilham ou indicam meu site me ajudam tanto, mas tanto. Não me refiro só ao crescimento do blog, falo de mim mesma. Vocês salvam minha vida.

Obrigada por me fazerem uma vencedora dia após dia. Eu amo o que eu faço mais do que tudo e não engulo em seco ao pensar que farei isso para o resto da vida. Eu me encontrei, dentro de mim e dentro de cada coração que me cabe.

A gente é o que a gente é. Às vezes, o contrário do que nos disseram pra ser. Nada do que lhe disseram realmente importa. A realidade também pode ser um sonho.

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