Ouvia todos seus comentários implicantes sobre as minhas novelas e achava graça. Sentia seu perfume e rodopiava perguntando se gostava do meu vestido, mas você não ligava. A forma como arrastava a chinela e caminhava devagar, como se o mundo te esperasse, me irritava um pouco.

Tinha realmente algo de contagiante na sua risada que eu não conseguia evitar imitar, você sabia. Em segredo admirava cada detalhe que te fazia único, mas você agiu igual a todos.

Você me jurou honestidade que nunca deu. E todos aqueles planos tão bem desenhados não saíram da folha do papel. Eu te pedi fidelidade e você achou que compromisso era esconder do coração o que os olhos não pudessem ver.

Você me ensinou a acreditar em farsas e contestar verdades irrefutáveis. E todo aquele jogo de palavras, por fim, fez sentido. E as mentiras que eu não quis entender de tão claras me cegaram.

Consigo te ver entrando no quarto; nervoso, ofegante. Andando de um lado para o outro, apontando para mim. Meu coração palpita. Quero te abraçar. Eu não sei como chegamos aqui, tento dizer mas você não ouve. Acho que você grita, mas eu não te escuto. Em desespero te encaro na esperança de que se lembre como éramos felizes, mas você não está aqui. Já é noite e me pergunto por quantos anos eu vivi até que esse dia passasse.

De novo, lá está você entrando no quarto. Dessa vez, está acanhado, traz rosas na mão e um humilde pedido de desculpas nos lábios. Deus sabe como eu quero te perdoar, esquecer o passado, te conhecer outra vez. Em silêncio te suplico que não me deixe, mas você já foi. Eu estou sozinha e tudo está tranquilo.

Consigo te ver fazendo careta pro sol que nos acorda cedo. Você me abraça, me puxa pra perto, substitui meu cobertor. Sussurra promessas que não pode cumprir ao pé do meu ouvido. Finjo dormir em teus braços enquanto a luz que clareia teus olhos nos ilumina. Em paz agradeço a minha sorte pela eternidade nesse minuto, mas você não está mais aqui.

Eu quero ligar pra você, saber quando paramos de dar certo, quem definiu que devíamos terminar. Quero ouvir da sua boca nas mais inimagináveis línguas a certeza do fim. Quero voltar no tempo, desfazer os erros, refazer as malas. Quero te tirar da sua realidade, te trazer dos meus sonhos. Quero acreditar que tudo foi um engano e que vou acordar com seu bom dia de novo, mas você não volta.

Repito a cena do fim tanto quanto já nem sei mais quem terminou. Ou quem eu sou. Tomo medidas drásticas. Me desfaço das suas esquecidas roupas, superestimadas cartas. Me despeço de seus filmes, suas bandas e seu creme dental favorito. Desvio do quarteirão do seu trabalho, ignoro a buzina de carros iguais ao seu. E se me veem a mente alguma lembrança tua, eu me apego tanto que abuso. Não vejo mais graça nas nossas piadas internas, não sinto mais o teu lado da cama quente.

Tenho que te confessar, eu ainda espero aquelas rosas que nunca me enviou. Mas não é de um falso amor que eu preciso, apenas de um desfecho. E mesmo assim, sem tua consideração, sinceramente, eu segui em frente. Engoli o choro, fiz prosa, fiz reza. Eu brinquei de faz de conta e pouco a pouco fui esquecendo seu sorriso tímido, seu cabelo bagunçado. E pouco a pouco, fui me refazendo, me conhecendo.

Desde que você se foi, não sou mais a mesma. Conheci alguém que me tomou o seu lugar e que não me deixa voltar atrás. Que abriu meus olhos, acalmou meu choro e deu a certeza que única era eu; você, só mais um. Conheci alguém chamado Amor-próprio.

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