Aprendi à duras penas que sabedoria era me calar diante dos recorrentes pedidos de consolo. Mas tem uma hora que cansa e você explode ríspida, ávida. Cuspindo com feroz prepotência o alívio de despejar o fardo das mentiras que ouvira até então. Quando não, sente-se apenas saturada, quase que entediada pela inércia dos diálogos.

– Decidi dar um tempo com ele, sabe? Pra ele dar valor, sentir que me perdeu.

– Um tempo é fundamental e funciona como divisor de águas. Se ele realmente se importar contigo, o tempo vai uni-los, mas se não se importar, então o tempo vai te curar da agonia de correr atrás e você vai superar.

– É, tem razão. Por que assim, eu tenho certeza que ele vem atrás. Tenho certeza. O negócio é que eu nunca dou tempo pra ele vir…

– Hunrrum…

– Por isso decidi dar esse tempo. Ele vai sentir que me perdeu e vai vir atrás.

– Ou você vai superá-lo.

– Por que? Você acha que ele não vem atrás?

– Como eu poderia saber? Eu tô te mostrando que só há lados positivos no tempo e…

– Mas assim, teve aquela vez que eu passei três dias sem falar com ele no whatsapp e ele disse que eu estava sumida. Ah, inclusive, é sempre ele que vem falar comigo. Eu nunca puxo assunto, nunca mesmo.

– hunf…Entendo.

– Esse tempo é porque ele diz que eu sufoco ele também. Diz que eu fico muito em cima, que não dou nenhuma liberdade. Ele se sente preso, sabe? E assim, ele não é meu namorado. Ele tá certo.

– Muito conveniente esse tempo “pra ele sentir sua falta” depois de ter lhe dito isso.

– Como assim? Você acha que ele não vai sentir minha falta?

– Como.eu.poderia.saber?!

– Mas, talvez, se ele pensar que eu tô me afastando pra lhe dar liberdade, não venha atrás. Isso não vai dar certo. Acho que ele não vem atrás! O que você acha?

– hunf… Eu acho que ele vem atrás. E acho que te ama e casarão e terão 3 filhos, dois cachorros e um papagaio.

– Você acha que ele gosta de mim?

– Claro…

– Eu gosto tanto dele, mas tanto… tô com tantas saudades…

– Mas você nem começou a dar o tempo ainda!

– Ah, mas quer saber? Que se dane. Vou ligar pra ele agora.

 

Aprendi, aos poucos, a ignorar as ofensivas frases de que eu não conseguia realmente entender esse amor avassalador de Deus do Olimpo porque eu jamais conseguiria viver algo que se igualasse. Como se essas juras de eterno compromisso não tivessem sido tiradas de embalagens de Sonho de Valsa ou como se suas declarações em públicos não passassem da certeza de ter na memória aquela música que lhe era marcante. Aprendi a forçar sorrisos amarelos ao ouvir as histórias tão bem ensaiadas de gestos majestosos, mimos extremamente românticos, evitando me perguntar o que diabos ela deve ter passado pra poder achar que valeu à pena por conta de um punhado de rosas e desculpas escritas às pressas num cartão. Aprendi a fingir não notar a exaltação na voz para enaltecer as qualidades quando outro casal se aproximasse. Nesse tipo de competitividade, eu era juíza. Era de mim que queriam ouvir aprovação ou despeito. Sim, porque não existia essa de consequências, nem recompensas. Se eu não pudesse concordar com a expectativa de serem perfeitos, então, naturalmente eu era despeitada.

 

Mas é que eu sempre tive outra ideia, outro tipo de consolo. Não acredito mesmo nesse negócio de amor à primeira vista e nem que valha à pena passar por cima de tudo e todos pra conseguir quem quer. Porque, na realidade, há tanta gente lá fora. Lá fora mesmo e não só aonde sua vista alcança. Gente que está além do seu limite de gosto em comum, gente que está do outro lado da cortina e você não nota. Tem gente que já esteve com você, mas você não viu. E gente que poderia te fazer um bem danado, se você deixasse. Mas, se você se conforma com o que tem ao seu redor, não vai mesmo ter outro amor na sua vida. Até porque, vamos combinar, se encontrar um amor já é difícil, quem dirá dois no mesmo lugar! Mas a questão é essa, quem disse que na vida a gente só tem uma chance de amor verdadeiro? Eu quero acreditar que não tenha vivido isso ainda e por isso não consiga entender essa dependência de um só coração que sequer te pertenceu. Mas, honestamente, não faz sentido. E não é por falta de paixão, não. Aliás, paixão, amor, tesão, eu tenho de sobra. Acontece que, tenho quase certeza que eu e essas garotas do “relacionamento perfeito” caminhamos em lados opostos. Não menosprezo nem duvido que elas tenham vivido uma excitante trama de cinema, quanto à mim só conheci o amor sereno, tranquilo e meu. O conhecido amor-próprio; o melhor consolo da alma, o melhor amigo do tempo.

 

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